sexta-feira, julho 24, 2009

O sentido de Santana

Como com Durão Barroso, tenho de dizer algo aos costumes, a bem da clareza. A verdade é que conheço Pedro Santana Lopes desde 1975. É uma vida. Estivemos juntos na fundação e direcção do MID (*), passámos muitas horas de muitos dias em concordâncias e discordâncias, solidariedades e desaguisados acesos: é sempre assim, quando se pensa pela própria cabeça.
Santana foi depois muito cobiçado pela JS, mas acabou por se decidir pela JSD e pelo PPD. Tinha já em si o fascínio por Sá Carneiro, e pelo seu projecto. Esteve nos trabalhos da primeira revisão constitucional, passou pelo Parlamento, por várias áreas e ofícios da "sociedade civil".
Foi "Nova Esperança" do PSD, entrou a bordo do cavaquismo original (que ajudou a arquitectar), seguiu depois um caminho autónomo, público e notório, muito criticado e muito idolatrado. Este levou-o do Poder Local, a seguir a uma épica eleição lisboeta, à chefia do Governo.
A história foi sempre mal entendida. Ao contrário do "pacto secreto" entre Tony Blair e Gordon Brown, pelo qual aquele alegadamente prometera passar o poder ao segundo (ansioso pelo cargo), ao fim de um tempo razoável, sem eleições, o compromisso entre Durão e Santana derivou de uma emergência, e não da vontade deste.
Em boa verdade, não era segredo que muitos, no PSD, olhavam como objectivo estratégico real uma campanha presidencial de Santana, para suceder a Jorge Sampaio. Mas a decisão abrupta de Durão atirou-o para "primeiro-ministro à força". Mais ninguém, na coligação PSD-PP, estava disponível.
O Santana que agora se apresenta às eleições de Lisboa é este.

Mas também aquele que tomou decisões profundas e controversas na capital. Mas também aquele que prometeu transformar a cidade numa urbe internacional de referência. Mas também aquele que eliminou excessos, e obrigou muitas pessoas a trabalhar, até altas horas.

Mas também aquele que transformou Lisboa no centro da vida política nacional.
Quando anunciou a sua recandidatura, muitos meses atrás, expliquei que achava uma má ideia.

Não penso que Santana ganhasse em banhar-se nas mesmas águas, ou em regressar ao local do início. Via-o mais como um político nacional "em reserva", o presidente de uma fundação social, um profissional para outros voos.

Mas uma decisão política, por péssima que seja, pode ser sempre melhor do que a alternativa. Nesse sentido, Churchill explicava que a "democracia é o pior regime, à excepção de todos os outros".

Ora a verdade é que, em alternativa a Santana, em Lisboa, só se vê o caos.
Caos de projectos, caos de ausência de projectos, caos de interferência governamental, caos de sujidade, de pobreza, de degradação, de inferno dos que sempre viveram aqui, e cá querem morrer.
Este caos pode até forçar António Costa a não se recandidatar: as suas palavras sobre os inauditos silêncios do Executivo, face aos poderes da cidade, seriam razão suficiente para que pensasse noutros projectos políticos, porventura mais entusiasmantes e menos frustrantes.
Santana é assim, mais do que um candidato consentido, um candidato com sentido.
É, claro, o pior candidato, à excepção de todos os outros.

(*) MOVIMENTO INDEPENDENTE DE DIREITO (E NÃO "DE DIREITA", COMO JÁ VI ERRONEAMENTE ESCRITO), FORMADO NA FACULDADE DE DIREITO DE LISBOA, COM GENTE DE IDEIAS E ORIGENS MUITO DIFERENTES. NA PRIMEIRA DIRECÇÃO, SE A MEMÓRIA NÃO ME FALHA, ESTAVAM AINDA O JOÃO GONÇALVES FERREIRA, O SAUDOSO JOSÉ MANUEL SEQUEIRA, O FERNANDO LARCHER NUNES E O MIGUEL COELHO.
por Nuno Rogeiro, in "Jornal de Noticias"

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