terça-feira, março 13, 2007

Informação é poder



13-Mar-2007

Quando está na oposição, o PS dá largas à sua costela radical e em toda e qualquer medida vê um regresso à ditadura (...) Uma vez chegado ao Governo, o mesmo PS vira costas à rua que tão bem utilizou e descobre-se um apóstolo da lei e da ordem.
É naturalmente tentador identificar, como fez Rui Tavares, José Sócrates com o intendente Pina Manique. Ao primeiro-ministro vão passar a reportar o secretário-geral para a Segurança Interna que tem acesso a toda a informação da PSP, GNR, PJ e o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. A isto há que juntar o Serviço de Informações da República Portuguesa, o Serviço de informações de Segurança e o Serviço de informações Estratégicas de Defesa já tutelados por Sócrates.Ao ser confrontado com estas mudanças, um ex-director da PJ, Santos Cabral, declarou ao Diário de Notícias: "Há que criar um mecanismo de compensação para este novo modelo, porque há muita informação nas mãos de uma só pessoa e, hoje em dia, informação é poder." Não é apenas hoje em dia. Já o era no tempo do intendente Pina Manique.
Aliás, por triste ironia, muita da discussão em torno dos serviços de segurança e sobretudo muitos dos temores acerca da promiscuidade entre o poder político e o poder judicial conduzem-nos à Casa Pia, a mais emblemática obra desse intendente. O processo Casa Pia revelou teias de cumplicidades e silêncios e confirmou que, de facto, "informação é poder".
Em que medida é que quem está no Governo, na Procuradoria, na Assembleia da República e nos serviços de informações usa o seu poder não apenas para fazer o seu trabalho mas também para impedir investigações que lhe sejam inconvenientes? Ou para obter informações que podem ser usadas contra aliados ou inimigos? Ou para coagir testemunhas? E se toda essa informação for concentrada numa pessoa? Estas são perguntas naturalmente feitas em voz alta nas democracias mas que em Portugal têm uma particular e infeliz ressonância.Mas se acerca das consequências perversas da concentração dos serviços de informações apenas podemos e devemos levantar questões, noutros campos já temos certezas. E a primeira delas respeita à relação do PS com a autoridade. Quando está na oposição, o PS dá largas à sua costela radical e em toda e qualquer medida vê um regresso à ditadura. O mais grave é que à iconografia da grilheta junta o PS uma prática irresponsável que o levou, por exemplo, a participar no bloqueio da Ponte 25 de Abril ou a apoiar reivindicações sindicais por parte das forças policiais. Uma vez chegado ao Governo, o mesmo PS vira costas à rua que tão bem utilizou e descobre-se um apóstolo da lei e da ordem.
Passa então a - legislar não apenas como quem está no poder mas sobretudo como quem acredita que lá vai ficar eternamente. Daí que nem sequer equacione o uso que outros podem vir a fazer da legislação que aprova. Quem não se recorda da fúria de alguns dirigentes socialistas quando descobriram que os seus telefones estavam sob escuta? Esqueciam que a legislação que tal permitiu fora da sua iniciativa.
Pode ser que ao voltar à oposição o PS descubra não só as potenciais perversidades da concentração de serviços de informações na figura do primeiro-ministro, mas também o autoritarismo implícito em algumas das suas actuais bandeiras, como o cartão único, a investigação da situação fiscal dos funcionários públicos e a divulgação da lista dos devedores ao fisco.

HELENA MATOS PÚBLICO 13.03.2007

Sem comentários:

Enviar um comentário