terça-feira, julho 15, 2008

Crónica Publicada no Notícias de Chaves de 11/07/2008

Crónica Publicada no Notícias de Chaves de 11/07/2008


Quem Tem Cú Tem Medo
Nos últimos 20 anos, centenas de Oficiais de Justiça (homens e mulheres), tanto nas respectivas Secretarias Judiciais, como em diligências de serviço externo (notificações, penhoras, entregas judiciais) foram insultados, sofreram agressões físicas, muitos foram corridos a tiro, foram-lhes atiçados cães, sendo que há notícia de pelo menos uma morte por arma de fogo

Em Santa Maria da Feira, durante um julgamento realizado num armazém (já que o edifício sede do órgão de soberania Tribunal ameaça ruir), os arguidos resolveram dar uns tabefes aos magistrados e gritar-lhes uns quantos desabafos.
Dois dias depois, em outra comarca, houve repetição da cena.
Infelizmente, digo eu, esqueceram-se de ir também à tromba aos advogados.
De imediato se assistiu à indignação e veemente "repúdio" de tais actos, por tudo quanto é associação e movimento corporativo e com uma ajudazita da ordem dos advogados (desculpem lá ser em caixa baixa, mas é intencional), em mais uma manifestação da velha hipocrisia judaico-cristã que se instalou no país como cultura.
Na generalidade dos tribunais, o tal cidadão de cabeça perdida, é na Secretaria Judicial que vai "desopilar", descarregar a bílis e toda a raiva provocada pelo sistema judicial, por decisões que lhe são adversas, pelo mau resultado do acompanhamento deficiente por parte do advogado.
Toda essa raiva e frustração acumuladas é descarregada em cima de quem – pela Justiça - dá a cara ao público, o funcionário judicial.
Aqui faço um interregno para lembrar uma «boca» dos anos 60 num jornal satírico francês, o famoso "Le Canard Enchainé" (o tal que se auto-intitulava de bête et méchant) que dizia que nesta vida, todos somos os pretos de alguém.
Os pretos eram os pretos do branco na África colonial; os árabes eram os pretos dos judeus; os argelinos eram os pretos dos franceses; na Europa, o pobre é o preto do rico; o operário é o preto do capitalista.
Nessa mesma linha, o Oficial de Justiça é o preto da Justiça!
Enquanto a tapona, o insulto, o tiro e o atiçar os cães era contra o preto da Justiça, porreiro pá, tudo bem. Nenhuma das "entidades" que agora reclamam por segurança nos tribunais, balbuciou sequer uma palavra de solidariedade, quanto mais se importou com isso. De repente isto encheu-se de caguinchas e medrosos a chorarem baba e ranho por protecção.
Oh gentes, que protecção e segurança quereis nos tribunais?
O polícia à porta a pedir os b.i?
Um guarda armado com uma MP5 em cada Secretaria Judicial?
Um pelotão dos GOE na sala de audiências?
Sentinela armada à porta de cada gabinete?
Para fazer o quê?
E o mais rotundamente hipócrita é que, quando são os pretos da Justiça a levar na corneta e tudo o mais, ninguém se inquieta e, se porventura, os funcionários se tivessem recusado a fazer serviço externo, ou permanecer nas secretarias, sempre queria ver qual seria a reacção institucional desde juízes a ministério.
Seria o ora então a macacada a querer fazer greve só por causa de uns tirinhos que até falharam e sai processo disciplinar. Agora, só porque dois ou três juízes levaram uns cascudos e ouviram meia dúzia de impropérios, fazem greve, acabam-se os julgamentos e tudo o mais, e fica assim como nos filmes dos cowboys!
Quando alguém começava a armar em caguinchas, o meu Pai costumava dizer "tens medo, compra um cão", que alternava com o "quem tem cú, tem medo".
Um camarada que trabalhava na Secretaria Judicial de Alenquer, quando aparecia o cidadão louco furioso a berrar o eu faço e aconteço, mato e esfolo, calmamente dizia, «Oh amigo, eu estou inocente, eu só trabalho aqui, os que mandam não estão aqui…» e assim se acalmava a berraria.

1 comentário:

  1. Falta acrescentar que em Portugal o branco é o preto do preto,ou pelo menos alguém tente fazê-lo.

    Cumprimentos

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